terça-feira, 12 de março de 2013

Sobre MEDITAÇÕES de René Descartes


Esta atividade envolve a leitura e interpretação de um trecho de uma tese de doutorado sobre Teoria do conhecimento e Ceticismo. O texto se relaciona a dois assuntos que você estudou em seu livro didático:
- Os argumentos céticos de Descartes acerca da dúvida sobre a existência do mundo exterior.
- A filosofia da linguagem comum de John Austin.
(Texto de Austin e a noção de alternativas relevantes, escrito por Flavio Williges em sua tese de doutorado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul): análise da atitude de Austin em relação à filosofia cartesiana e que se refere ao “cenário cético” presente nas Meditações de René Descartes.

PRIMEIRA ARGUMENTAÇÃO
A primeira argumentação cartesiana está presente na análise do sonho: no parágrafo quarto da primeira Meditação, o filósofo analisa a inquestionabilidade de seus sentidos com relação ao lugar em que está, as roupas que usa, o papel entre as mãos, o corpo vestido com um roupão: “Como é que eu poderia negar que estas mãos e este corpo sejam meus?”(DESCARTES, 2005); a seguir, no parágrafo quinto, aventa a possibilidade de que essa percepção do todo em si e em derredor de si possa ser parte de um sonho: “sou homem, costumo dormir e em meus sonhos as situações em que me encontro parecem muito reais, embora depois, acordado, saiba tudo não passar de sonho; logo, o que garantirá que não durmo neste momento?” (SANTIAGO, 2005) Seria o sonho semelhante a uma pintura onde o real e o verdadeiro se confundem? Pois as pinturas só podem ser formadas à semelhança de algo que seja verdadeiro, portanto, os membros de um corpo são reais, palpáveis, existentes, salvo se a imaginação fosse suficientemente “extravagante para inventar algo de tão novo que jamais sonhamos visto nada de semelhante, e que assim sua obra nos represente uma coisa puramente fingida” (DESCARTES, 2005).
Com este argumento, Descartes deve chegar “à dúvida sobre a falibilidade do conhecimento sensível” (TARGA, 2011).

SEGUNDA ARGUMENTAÇÃO
“Com o argumento do sonho Descartes elimina a certeza dos hábitos e a validade do senso comum como referências para um conhecimento absolutamente seguro.” (TARGA, 2011). Porém, mesmo que duvidemos da existência efetiva das percepções ambiente: o próprio corpo, local, objetos em derredor, sensações físicas de quente ou frio, ou seja, do conhecimento sensível, há a necessidade de existir uma matriz dessas representações visualizadas no sonho; uma matriz abstrata que represente a ordem que percebemos nelas. No parágrafo oitavo das “Meditações”, Descartes diz da sua opinião de que existe um deus, que tudo pode e por quem ele foi criado e é como se apresenta. As verdades matemáticas, exemplo dessa ordem abstrata, pois são inquestionáveis, estariam sob a égide desse deus, livre para alterar o cenário de suas percepções, um ser que enganasse até a percepção dessa matriz, tornando-a invalidada por sua ação: o deus enganador ou gênio maligno, pondo em dúvida essas verdades. O filósofo chega aqui ao ponto máximo da dúvida, “intentando ir mais além do que os próprios céticos, e assim poder tolhê-las todas de vez.” (SANTIAGO, 2005)

TERCEIRA ARGUMENTAÇÃO
A terceira argumentação, com base na existência do gênio maligno ou deus enganador, pretende “por em dúvida todas as classes de conhecimentos preestabelecidos”, chegando ao “grau máximo da dúvida” (TARGA, 2011), onde a realidade do mundo exterior é questionada ( a dúvida hiperbólica).

As reflexões de Austin sobre os problemas céticos geralmente são classificadas como uma filosofia do senso comum. Explique porque e cite uma passagem do texto que justifique a sua resposta.

Uma das teses importantes defendidas por Austin é a de que, na “História da Filosofia, os confrontos entre as teses filosóficas e as crenças populares são causados pela incompreensão de uma liguagem comum” (UNISUL, 2011). Austin ainda vai desenvolver suas argumentações a favor de um trabalho sobre a linguagem, e contra a dúvida cética a partir dos conhecimentos do senso comum e dos fatos comuns. Não se trata de reduzir as análises filosóficas às opiniões sem fundamento no conhecimento, como “crer que...” ou “ouvir dizer que..”, mas dos fatos e eventos que normalmente ocorrem no cotidiano e que postulam um questionamento de saber.

No primeiro parágrafo da tese de Williges, citando Kaplan, fica claro a intenção de Austin de avaliar os argumentos filosóficos conforme as práticas ordinárias humanas, já que tais práticas trazem “consequências importantes para o tratamento dos problemas filosóficos, particularmente do conceito de conhecimento. (...) Austin reconhece que, por mais cuidadosa que seja nossa tentativa de fazer asserções que tenham como alvo a verdade, sempre será possível localizar deficiências e juízos terão de ser refeitos.” (WILLIGES, 2009). Mas é justamente aí que reside o fundamento da verdade, pois “sempre será possível localizar deficiências e juízos terão que ser refeitos. (...) o saber é um empreendimento de risco.” (WILLIGES, 2009). Contudo, com essa argumentação não se invalida o processo de desenvolvimento do conhecimento. Ao contrário, ele é fonte de busca perene.

-excelente trabalho de interpretação textual. (Orientador: prof.Dante C. Targa)

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